sexta-feira, 30 de novembro de 2012

A vinculação de despesas envolve riscos.

    A vinculação das receitas a determinados tipos de despesas públicas e previsão em lei dos percentuais pode prejudicar os resultados da administração pública. Certos gastos podem exigir o deslocamento de percentuais maiores da arrecadação para áreas específicas. Certas fontes de receita, como os royalties, poderiam momentaneamente atender a outras áreas e não somente à educação como hoje definido. Não existe a possibilidade de autorização prévia para alocações que não se enquadrem nas proporções impostas. O descumprimento continuado das normas devido à sua não adequação à realidade da gestão pode fazer com que surja uma cultura de maus administradores e até mesmo induzir a prática de corrupção. 
    As áreas a serem atendidas com os gastos públicos são muitas e a cada ano as demandas são diferentes em cada uma delas. Certos aportes a uma área podem atingir valores muito grandes e que não obedeçam às proporcionalidade previstas na lei sem que isso signifique mal emprego dos recursos. A título de exemplo, é possível pensar que um município mais eficiente e com um valor satisfatório de ingressos pudesse cumprir todas as suas metas no ensino com apenas 20% do seu orçamento. Mas é obrigação constitucional do Município investir 25% do seu orçamento em educação.
    Em relação a receitas e percentuais de gastos a serem feitos terem de ser vinculados com determinadas áreas há o problema de se definir prioridades. Nesse caso, outra área importante , a saúde, poderia receber pelo menos parte dessa diferença, o que, legalmente não é possível. Mais se agrava a situação com a informação de que os royalties com a produção de petróleo também deverão ser atrelados a despesas com educação a partir deste final de ano de 2012. Neste caso é de se questionar se não foi ponderada a possibilidade de amarrar esses gastos à saúde.
    Não há uma instância capaz de autorizar a realocação desses recursos em proporcionalidade não prevista na lei. Um tribunal ou os órgãos de controle interno ou mesmo o ministério público não possuem autoridade para permitir diferenças nessa alocação. Não há como se formalizarem documentos que autorizem um prefeito municipal a descumprir esses percentuais, por mais nobre que seja a causa defendida.
    O fato é que tais leis tendem a não serem cumpridas em alguns casos e nos quais se vão eternizando.  Mas o preço pago pode ser alto. Muitas vezes os gastos são maquiados e a contabilidade dos municípios alterada para conseguir a aprovação de uma prestação de contas. O jogo de cintura e o uso de artimanhas são as formas encontradas para conseguir cumprir as metas. Isso ocorre mesmo nos casos em que não se constata nenhum desperdício ou imoralidade nos gastos.
    A imposição de uma legislação desconectada da realidade faz com que o gestor se acostume a descumprir a lei. Até mesmo o perfil do possível candidato a um cargo público pode ser definido pela necessidade de que ele seja capaz de se adaptar, negativamente, à necessidade de burlar as normas impostas. E pior ainda, esse administrador também pode se sentir no direito de, por causa do risco sofrido, exigir uma maior remuneração pelos serviços prestados, ainda que ilegal. Pode acontecer por exemplo que tal fato implique a possibilidade de que se venha a praticar irregularidades maiores buscando se locupletar.
    Apesar das boas intenções incutidas na criação de percentuais de gastos e vinculação de receitas há que se ponderar os riscos envolvidos. As limitações são impostas a diferentes realidades indiscriminadamente. As obrigações legais impõe proporções homogêneas podendo prejudicar os resultados a serem alcançados. Não existe instância autorizada a permitir a flexibilização desses volumes de gastos. O resultado é que os gestores tendem a se articular para dar soluções indevidas a tal imobilidade. Num círculo vicioso o gestor é convidado a agir ilegalmente podendo resultar, inclusive, numa pre-seleção de maus indivíduos que estejam dispostos a desafiar constantemente a legislação. 

Fiscalizações, auditorias e atividade policial não deveriam sofrer reduções de despesas pelos mesmos critérios de outras entidades.

    Os órgãos públicos que exercem atividades policiais, controle externo e interno e fiscalização em geral não deveriam ser submetidos a cortes lineares de despesas relacionadas às suas operações. Algumas exceções são abertas independente da vontade dos administradores. Já o estrito cumprimento da legislação pode provocar a perda do momento certo de se fazer uma intervenção eficiente. E a imagem passada ao público pode ser prejudicial à própria administração.  À opinião pública, ciente de tal situação, pode parecer que não há interesse da administração central em apurar irregularidades que pudessem lhe comprometer. Ainda que buscando a economia de recursos tais atitudes correm o risco de serem mal interpretadas.
As atividades policiais podem perder o momento certo para serem feitas se tiverem que se ater à obrigação de cumprimento de prazos de autorização para realização de despesas. É fato conhecido que, havendo necessidade explícita como no caso de uma ordem judicial, as ações policiais são autorizadas em caráter de emergência. Nesse caso, as despesas, inclusive diárias, que possuem legislação que manda que sejam pagas com antecedência – direito pessoal do servidor - possam ser restituídas em caráter de indenização. Certo é que o descumprimento continuado da legislação, mesmo com justa causa, pode criar uma cultura de descumprimento sistemático das normas.
    Outros órgãos, além dos que exercem atividades policiais, podem também ter um momento certo para que executem determinadas ações. A própria doutrina sobre controle e auditoria já inclui observação de que o melhor acompanhamento das atividades dos gestores públicos é realizada justamente ao longo da implementação dos projetos. As verificações efetuadas após a sua conclusão não alcançam o mesmo nível de eficácia. Uma obra mal executada, por exemplo, poderá resultar em gastos inúteis que não poderão ser restituídos ou corrigidos. E pior, o prejuízo só há de aumentar à medida que se busque a correção dos erros não verificados no devido momento.
    Há ainda o problema da visibilidade externa: A submissão das despesas de órgãos com funções de investigação, fiscalização e de auditoria aos mesmos critérios de autorização de outros órgãos pode denotar, conforme o volume em que ocorrem a possibilidade de que a população e ou a imprensa venham a perceber tal cerceamento como forma de proteger interesses escusos. Sempre é possível que haja manifestações do tipo: “Ora! Não há interesse em que tais órgãos executem suas respectivas funções.” Ou “num contexto, por exemplo, em que os mais atingidos pelas atividades seja a própria administração, é claro que não se deve incentivar tais trabalhos!”
    É importante garantir o pleno funcionamento das atividades policiais e de fiscalização em geral, inclusive controle interno e externo. Havendo demandas judiciais, por exemplo, as organizações terão de executá-las como for possível, inclusive com o sacrifício pessoal do direito às devidas verbas de indenização. Cria-se então uma cultura em que o descumprimento das normas faz parte do cotidiano das entidades. No contexto apresentado as atividades de controle também são prejudicada pelo caráter anacrônico em que passam a ser realizadas. Ao chegarem ao conhecimento público tais informações podem ser tratadas como meio de proteger interesses excusos e não de economizar os recursos públicos.

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Escolha o seu motivo para não ser associado a um sindicato

    A realidade em vários sindicatos é que os percentuais de associação são cada vez mais baixos. O resultado é que os ingressos financeiros ficam reduzidos e os projetos a serem realizados ficam cada vez mais  colocados em risco. 
    Agrava o problema o fato de que uma agremiação com um percentual muito baixo de associação pode ter sua capacidade de representação questionada pelos negociadores dos empregadores.
    Fatos como o ocorrido com os funcionários de um dos bancos oficiais são bem ilustrativos. A entidade conta com um percentual de associação inferior a 40%. Chamados a participar das assembleias, o comparecimento,  mesmo dos sindicalizados, foi ínfimo. O governo dava, exatamente naquele dia, um ultimato aos sindicatos para que aceitassem ou não uma proposta de aumento definitiva e indiscutível. Sem qualquer respaldo para se posicionar definitivamente, os responsáveis pelo sindicato não acolheram a proposta do empregador. 
    Quando surpreendidos pelo fato de que ficariam sem aumento no ano seguinte, os servidores, sindicalizados ou não, decidiram por culpar a associação pelo ocorrido.
    O caso acima é apenas um exemplo de que o caminho da não associação é um caminho perigoso. Mas não basta exemplificar o que pode acontecer de errado quando não houver a devida adesão dos servidores ao sindicato. É importante também pesquisar e tentar identificar os motivos pessoais que levam este ou aquele servidor a não se associar.
    Buscando suscitar possibilidades para o entendimento da questão são apresentados a seguir alguns esboços das possíveis motivações para que os servidores, sobretudo os recém admitidos não se interessem em participar dessas agremiações.
    Todos os motivos alegados para que um servidor não se associe a um sindicato ou associação de funcionários são ruins. Alguns casos se devem ao caráter da pessoa que os invoca e podem demonstrar algum tipo de abjeção ou mesmo fragilidade mental. Já outros  são ruins por  justificarem a não adesão de boas pessoas e bons companheiros de trabalho. Observação necessária a ser feita é que, como em qualquer assunto que se relacione ao ser humano, a decisão por se associar é fruto de um processo de interação entre dois ou mais dos argumentos que são detalhados a seguir. 
    Em relação à conformação do caráter da pessoa que se nega a ser sindicalizada podem ser  citadas pelo menos três situações. No primeiro caso existe a certeza de que outros associados farão os pagamentos necessários à subsistência da associação e sustentarão a causa para os que não se associarem. Outro caso que diz muito sobre a personalidade do servidor é não se associar para não gastar o dinheiro da mensalidade. Mais inofensivo é aquela pessoa que não participa de nada mesmo por pura deficiência na capacidade humana de interação.
    Maquiavelismo é pouco para descrever esse primeiro caso. Ciente de que vários servidores mais conscientes não deixarão de financiar o sindicato ou a associação, estes tipos jamais se sentirão na obrigação de comparecerem com os recursos financeiros que tanto prezam. Mais elaborada que a simples propensão à economia originada na avareza, este cidadão é capaz de fazer uma análise mais elaborada da situação e chegar à conclusão de será capaz de usufruir os mesmos benefícios que os outros sem que tenha desembolsar qualquer ganho.
    O avarento não vai contribuir para o sindicato para não gastar o dinheiro da mensalidade mesmo. Não se trata de uma decisão pensada como no caso do maquiavélico. Trata-se apenas do impulso impensado e instintivo do coletor compulsivo. Não importam a ele considerações éticas, participação social, agregação ou outro tipo de argumentação sobre a necessidade de participar. O seu impulso e a sua forma de existir estão ligados à acumulação irrefletida de qualquer trocado que puder amealhar ou melhor, deixar de gastar. O seu dia a dia será gasto, como soe acontecer nesses casos, em inventar motivos para não gastar e meios de justificar a economia exacerbada.
    A menos agressiva das características pessoais é a daquele colega que tem uma conduta relativamente inerte em relação à convivência e à participação social de qualquer espécie. Seja por timidez ou embotamento mental ele não consegue uma interação satisfatória em várias situações do dia a dia. Não vai a reuniões sociais com os outros colaboradores, não se preocupa em distribuir bom dias ou visitar a sala dos outros a não ser por necessidade. Neste caso a não associação ao sindicato é apenas uma faceta desse comportamento indolente. Geralmente trata-se daquele tipo de pessoa que fazia papel de árvore ou de riozinho no teatro da escola. São os famosos “caras de paisagem”.
    É importante notar, entretanto que alguns motivos são um pouco mais nobres e justificados. Pode ser a dificuldade em organizar o orçamento para conseguir fazer os pagamentos. Pode ser a sensação de estar sendo usurpado pelo pagamento de um valor que será mal utilizado. A falta de confiança na direção do sindicato devido ao histórico ruim de gestões anteriores e à repulsa generalizada a assuntos de natureza política são outros motivos que podem ser identificados para a não associação. 
    Em alguma fase da vida qualquer pessoa poderá ter dificuldades financeiras. É até natural que isso aconteça e certamente as despesas menos importantes é que deverão ser cortadas. Nos casos em que o servidor chegar à conclusão que o custo benefício de ser associado não está valendo a pena e naquele exato momento estiver titubeando em controlar seu orçamento, este poderá ser o momento em que ele não se associará. Mesmo um associado que não for devidamente amparado, coisa que os sindicatos poderiam ser autorizados a fazer, mas não são, pode vir a considerar a hipótese de deixar a associação mesmo que momentaneamente.
    Às vezes o abandono do sindicato pelo servidor para economizar pode ser meio questionável. Em casos como aqueles em que o recolhimento é inferior a 1% do salário mensal, por exemplo, o acréscimo na renda líquida pela ausência do desconto referente ao sindicato pode ser mais psicológico que efetivo. Num universo salarial de R$5.000,00, por exemplo, o incremento de R$40,00 certamente não terá impacto definitivo na solução dos problemas financeiros do servidor.  Consideradas todas as outras implicações de participação e possíveis benefícios recebidos, várias serão as situações em será melhor continuar associado.
    Outro caso em que a não associação tem que ser respeitada é quando o sindicato não inspira confiança nos associados em potencial. Infelizmente o histórico de determinadas associações inclui desvios, falta de prestação de contas e mesmo a roubalheira desenfreada. Em certos casos até mesmo o histórico pessoal de ex-presidentes e outras pessoas ligadas à cúpula da associação faz com que essa carregue uma pecha de má gestão. Cabe aos possíveis associados verificar se há novidades nas novas gestões que possibilitem uma visão mais otimista sobre os destinos do dinheiro que está sendo tomado de seu salário.
    A falta de informação e a cultura pessoal restrita é um outro fator que deve ser respeitado quando um servidor não quiser ser associado. Muitas pessoas que atualmente estão ingressando nos concursos são oriundos de famílias que vivenciaram o peso do período ditatorial no país. Este é apenas um exemplo de várias situações que podem trazer ao possível associado a impressão de que se sindicalizar é uma forma de rebelião, de “procurar problemas” e de não cumprir devidamente os deveres de cidadão e, principalmente do cargo que ocupa. Somente a disseminação de informações concretas sobre o direito de associação e o apregoamento da necessidade dessa associação poderão vir, talvez a reverter esse processo de não reconhecimento dos próprios direitos bem como a necessidade do exercício de seus direitos constitucionais.
    Repulsa generalizada a assuntos relacionados a politica. A expressão quase não precisa ser explicada. Há uma  arraigada cultura difundida pela imprensa e vivida pelo contribuinte de que a maioria do que se trata sobre política é abjeto. Os assuntos assim como seus atores são, de forma generalizada, considerados anti-ético, merecendo desprezo pelo cidadão que busca agir de maneira mais correta. Não seriam necessários muitos outros argumentos para que se sentisse aversão à sindicalização. Basta se cogitar a possibilidade de se estar indiretamente contribuindo para a campanha de um deputado ou senador, por exemplo, em busca de favorecimento na obtenção de aumentos e outros benefícios para a carreira.
    Infelizmente a argumentação para que um servidor não seja associado gira muito em torno dos valores financeiros. Qualquer um que tenha um mínimo de bom senso vai levar em conta o fato de que há um determinado valor saindo de seu salário e que esse valor deve ser o mais bem empregado possível. Considerações sobre a necessidade de agremiação, sobre a capacidade de mobilização do sindicato somente terão caráter acessório quando não se puder valorizar, quantificar, efetivamente o benefício recebido pelo fato de ser associado.
    Raros devem ser os casos em que dois ou mais dos “sintomas” aqui listados não se combinem para determinar a motivação para que um servidor não queira se associar a um sindicato. Cabe aos interessados, inclusive o simples sindicalizados mas principalmente aos quadros da direção que tentem pesquisar e entender a motivação para se refutar a associação. Em seguida cabe a análise da situação diagnosticada e a criação de um projeto sistemático e tão abrangente quanto possível para a reversão do quadro apresentado, ou em última instância, a sua melhoria.
    Erros de avaliação sempre ocorrerão. Tanto o servidor de posse de seu direito não obrigatório de associação quanto as entidades precisam estar conscientes da necessidade constante da revisão de suas posições. Somente o trabalho continuado de pesquisa, distribuição de informação e argumentação permitirá que tais instituições previstas e autorizadas pela Constituição Federal continuem exercendo devidamente suas funções de equilibrar as relações entre empregadores e empregados.