segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Corridas de Rua – Modismo e incompetência

    O lado bom das Corridas de Rua quase não precisa ser lembrado. O zelo pela saúde e os respectivos resultados são amplamente conhecidos. O encontro com novos e velhos amigos cria uma motivação especial e que se renova a cada evento.  Já a satisfação de procurar os bons os resultados não tem preço, sejam eles quais forem.
    Quanto à saúde é fácil ver que até certo ponto a corrida é uma panaceia, um remédio para todos os males.  Melhoria da circulação sanguínea e da frequência cardíaca, benefícios à estrutura física e vários outros aspectos são beneficiados. Até mesmo do ponto de vista psicológico há benefícios indiscutíveis. A atenção que é desviada dos problemas maiores para a concentração no esporte. A descarga física que provoca reações químicas positivas no organismo. Ainda há a sensação de repouso, de tranquilidade depois das atividades.
    Em relação aos amigos é difícil descobri o que é melhor: As corridas proporcionam várias oportunidades de se encontrar novas amizades. Os eventos também ajudam a consolidar amizades antigas. De qualquer maneira, o importante é o instinto gregário do ser humano sendo privilegiado. Vantagem indiscutível é a de que a convivência não depende,  pelo menos o tempo todo, da ingestão de álcool como em outros ambientes. Os encontros ocorrem de forma aleatória em alguns casos, como quando se vê amigos antigos e que são encontrados nos eventos sem que isso tenha sido resultado de qualquer planejamento. Já outros encontros são bem previsíveis como, por exemplo, quando se visita uma equipe de corrida e se encontram aquelas figurinhas carimbadas que já fazem parte daquela turma.
    Os resultados são, em nível pessoal, uma parcela importante de tudo que ganha nas corridas. Conseguir atingir uma meta, é um exemplo, mesmo que seja a de não parar de correr até a chegada. Também é divertido tentar manter um ritmo para se obter um determinado tempo. Em alguns casos, apesar de amadores, alguns corredores têm como meta o pódio. Apesar de serem poucas as pessoas que podem se dar a esse luxo, também é um objetivo louvável nas corridas. A superação vem de qualquer forma. Até por se estar sem treinar há  muito tempo ou por não se ter passado bem no dia anterior. A satisfação de conseguir chegar é indiscutível. Até uma ressaca controlável é um ponto a mais para sentir-se superando as expectativas.
    Mas essa coisa toda de virar moda faz com que algumas interpretações do assunto fiquem meio deturpadas. Pelo lado dos atletas vê-se gente que não tem perfil nem para levar o lixo para fora tentando fazer algo que não condiz com o seu caráter.  Pelo lado das empresas há organizações com baixo nível de profissionalização e que dá sorte de organizar o evento certo por pior que sejam as condições que oferecem. E ainda há os efeitos externos da realização dos eventos tanto para  as famílias quanto para a comunidade em geral.
    O caráter de uma pessoa não precisa ser ruim para ser fraco. O fato de o sujeito não ser capaz de fazer um esforço maior, como no caso de uma corrida de rua “de verdade”,  não diz necessariamente nada de mal sobre ele. É até normal que alguns seres da espécie mantenham um comportamento atávico de autoproteção e evitem a todo custo desgastar as energias do corpo. Essa diversidade foi importante para que a raça humana chegasse até aqui. É importante que existam os fortes que vão atrás e se atiram aos desafios. E que também haja os fracos que ficam para trás e que enterram os guerreiros e curam os feridos.
    O problema é quando não se percebe que não há como lutar contra o próprio perfil. Nas corridas acontece isso. Gasta-se um bom dinheiro. Compra-se um tênis caro. Paga-se uma assessoria de corrida. Mas não há como mudar o perfil, as características psicológicas. Então o sujeito vai lá, mas não vai. Não há empenho, energia, postura de quem vai conseguir. São os grandes passeadores das eternas provas de 5km que só servem para encher os bolsos dos organizadores. Mais um obstáculo para se desviar para quem vem atrás. Só isso.
    Há eventos realmente muito importantes de corrida de rua acontecendo por aí. Todos esses eventos nasceram pequenos. E pequenas e não tão profissionais também eram as empresas que os organizavam. Acontece que os empresários parecem fechar os olhos às necessidades de acompanhar esse crescimento. O número de corredores vai aumentando. As necessidades de organização, logística, de treinamento de colaboradores crescem junto. Mas a ambição e a vontade enorme de ganhar dinheiro não permitem que se façam as devidas adequações.
    O resultado são eventos enormes com milhares de corredores e com péssima organização. Os postos de água são muito distantes. Não há continuidade no abastecimento dos postos. O ritmo de corrida é prejudicado devido ao risco que simplesmente não haja mais hidratação no resto do percurso. Horários de saída e percurso podem ser modificados unilateralmente pela empresa. Não há preocupação com cortesia ou com bom atendimento. O próprio texto dos regulamentos mostra a falta de empatia com o “cliente” corredor devido à frieza com que trata de qualquer assunto.
    O kit e seus componentes são a materialização clara da incompetência. Os empresários não lembram que os nomes de suas empresas estão ali gravados e que trata-se de cartões de visita. Aqui também o negócio é economizar. Abusa-se do baixo custo na confecção de cada item. A qualidade das medalhas é cada vez mais inferior e deixam de ter misturas de materiais e ou cores. Vão ficando cada vez menores e desinteressantes como se fosse impossível aos corredores não compará-las com as anteriores. As camisas são de material ridículo que nem consegue imitar um “dri-fit”, seja de que qualidade for. Ainda na embalagem essas camisetas já vêm cheias de fios soltos e desmontam no corpo já no primeiro uso. Tudo isso vai colaborando para construir uma imagem negativa da empresa e mesmo do próprio evento.
    Em relação à população em geral os organizadores também não demonstram grande empatia. O fechamento de determinas vias deve ser rápido e programado. Devem haver planos de escape para quem se vir preso no trânsito por causa do evento. Apesar da boa colaboração da polícia e outras entidades, a organização deve ser rápida na liberação dos espaços. O que se vê é cidadão revoltado com os impedimentos muito prolongados do tráfego e com a intransigência dos promotores desses eventos. O bom relacionamento com a população em geral é um pressuposto para a longevidade desse esporte.
    O esporte denominado “Corrida de Rua” precisa ser pensado e repensado para continuar dando os bons frutos que vem dando. Por um lado alguns pretensos corredores precisam se conscientizar do que seja realmente praticar esse esporte. As empresas organizadoras, por sua vez, devem se organizar melhor e não poupar gastos onde isso possa ser prejudicial. O público interno e externo deve ser respeitado da mesma forma.  A qualidade não deve ser vista como gasto desnecessário mas como forma de garantir a continuidade dos empreendimentos.
    O texto abaixo foi enviado a uma empresa organizadora de um grande evento anual de corrida em Belo Horizonte. A forma e o vocabulário são resultados da pressa e da motivação negativa para escrevê-lo. Mas divulgá-lo tem o objetivo de mostrar a indignação do autor com a bagunça que vem se consolidando como a marca registrada do trabalho de certas organizações.
    “Toda hora essa empresa dá mostras de que quer dificultar a coisas para os corredores. Trata-se de pessoas esses números que vocês tanto pedem acima. Não é só arrecadar não. Ontem foi um ótimo exemplo: Primeiro posto de água aos 4km??? Sem noção. As redes sociais estão aí para divulgar essas coisas. E as exigências ridículas para pegar o kit. Se eu tenho a identidade e o meu nome e cpf estão comprovados de alguma forma, então já era. Entregue-me o meu kit pelo qual eu paguei. Que tipo de empresa acha correta essa buRROcracia toda. Vcs são do governo? Outra coisa é a garrafa fechada de água. E as mudanças de percurso: "quem quiser que peça reembolso". Não importa não é? Por incrível que pareça, um pouco de humanidade não atrapalha as empresas de existirem não. Imagina-se, ou melhor, se vê o que fazem com seus empregados, tipo os poucos que foram contratados para entregar água. Ralação total e falta de organização geral. Treinamento, treinamento e mais treinamento para o staff é o que Vcs precisam. Aprendam a trabalhar com gente que organiza eventos que provoquem menos reclamações. E deixem de ser uns robots em que tudo deve acontecer do jeito que vcs querem. O evento volta da pampulha é um achado que ainda pode ser uma mina de dinheiro - já que isso é o que importa - por muitos anos. Mas a ficha das pessoas pode cair e mostrar o quanto é tudo bagunçado e desumano. Sinto muito esse texto pois eu sei que há gente boa em todos os lugares. Apesar de ser muito difícil perceber isso, às vezes...”

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